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Cinedebate

Cinedebate abordou a luta por ensino superior gratuito nos EUA

Publicado: Segunda, 19 de Março de 2018, 14h53 | Última atualização em Quinta, 15 de Setembro de 2022, 16h19

No dia 17 de março de 2018, sábado, a partir das 09h45 da manhã, no auditório do Câmpus de Caraguatatuba do Instituto Federal de São Paulo (IFSP), ocorreu a exibição – seguida pelo posterior debate – do documentário norte-americano “Torre de Marfim: A crise universitária americana”. A organização deste cinedebate contou com o apoio de ex-bolsistas de iniciação científica e do programa de extensão “Cinedebate e atividades de educação científica e cultural” (Izabela Duarte, Kauã Estevam Cardoso de Freitas, Rodrigo Henrique Revelete Godoy, Rafael Honório Morais de Oliveira e Rafael do Nascimento Sorensen), bem como do atual bolsista de iniciação científica (com bolsa PIBIC/CNPq) João Pereira Neto, todos eles orientados pelo professor Ricardo Roberto Plaza Teixeira, docente do IFSP-Caraguatatuba.

Professor Ricardo Plaza com estudantes que ajudaram a organizar este cinedebate

O professor Nelson Alves Pinto (docente da área de informática do IFSP-Caraguatatuba) sugeriu ainda em 2017 a indicação deste documentário para um cinedebate, ideia esta que foi prontamente aceita pelo professor Ricardo Plaza. Além do professor Nelson, este cinedebate contou também com a participação da professora Regina Aparecida Berardi Osório (docente da área de educação do IFSP-Caraguatatuba).

Professores Nelson, Regina e Ricardo Plaza

O documentário “Torre de Marfim: A crise universitária americana” (o título original em inglês é “Ivory Tower”) foi lançado em 2014 e foi escrito e dirigido por Andrew Rossi. Esta obra foi selecionada para concorrer ao prêmio de melhor documentário no Festival Sundance de Cinema. O seu trailer legendado em português pode ser visto em: <https://www.youtube.com/watch?v=GQxODklXFZg>. Mais informações sobre este documentário podem ser obtidas (em inglês) no link: <https://www.imdb.com/title/tt3263520/?ref_=nv_sr_1>.

Professor Nelson faz uma breve apresentação sobre o documentário antes da sua exibição

O documentário “Torre de Marfim” aborda os altos custos para conseguir estudar em instituições de nível superior nos Estados Unidos: por este motivo, muitos estudantes universitários adquirem dívidas de mais que 100 mil dólares que demoram muitos anos e em alguns casos décadas para serem pagas. Segundo o economista e professor Richard Wolff, cada vez mais estudantes universitários norte-americanos pegam emprestado muito mais do que podem pagar e depois de formados conseguem apenas empregos que jamais deixarão que a dívida seja quitada. Já o linguista e ativista Noam Chomsky considera as mensalidades cada vez mais altas das universidades norte-americanas uma verdadeira forma de doutrinação em favor do sistema capitalista de cunho neoliberal.

Mesmo as universidades públicas norte-americanas cobram mensalidades que vem sistematicamente subindo muito mais que a inflação nas últimas décadas nos EUA. Em alguns casos, os preços são tão proibitivos, que muitos abandonam os estudos ou decidem que não pretendem fazer um curso universitário: segundo o documentário, o custo é tão alto que cada vez mais pessoas simplesmente não querem mais pagar para estudar em nível superior, por concluírem que não vale a pena. Há inclusive, por exemplo, na cidade de São Francisco (na Califórnia), um movimento (“UnCollege”) em favor de “hackear” a educação e que propõe que os estudantes universitários larguem seus estudos, já que para seus adeptos, os cursos universitários não valem os preços gigantescos que são cobrados: o documentário cita cifras como cursos universitários que cobram 60 mil dólares por ano!

Gráfico apresentado no documentário mostrando que o custo dos estudos em universidades norte-americanas subiu 1120% desde os anos 1980

A mercantilização de tudo nos Estados Unidos foi discutido ao longo do debate, inclusive provocado por cenas de manifestações estudantis em que eram exibidas faixas com dizeres como “Educação é um direito” (“Education is a right”), e não uma mercadoria! Uma das faixas carregadas por alunos em uma cena do documentário afirma: “Nós somos estudantes, não clientes” (“We are students not customers”). O documentário também mostrou que a tentativa de baratear a educação superior por meio da massificação da educação à distância (EaD), com o uso da internet, não deu certo, pois os índices de abandono e de reprovação na EaD se mostraram bem mais altos que os da educação presencial. Pode parecer inicialmente que criar um curso universitário pela internet é mais fácil e barato. De fato, diversas das aulas destes cursos online que estão disponíveis na internet de ajudam, de modo complementar, na aprendizagem de muitos que estudam em universidades presenciais, mas como mostram várias pesquisas (inclusive no Brasil), a EaD é mais adequada para estudantes mais maduros intelectualmente, geralmente com mais de 30 anos de idade, que já completaram um curso superior previamente, com maior bagagem acadêmica e com grande autodisciplina. Na faixa etária majoritária dos estudantes universitários (entre 18 e 24 anos), o contato direto com o professor presencial nas aulas e em outras atividades de ensino e a convivência social entre os colegas no ambiente universitário tem se mostrado fundamental para o sucesso na aprendizagem da ampla maioria destes jovens.
O documentário “Torre de Marfim” exibiu cenas de movimentos estudantis contra a cobrança de mensalidades em universidades norte-americanas (inclusive com a ocupação de universidades e reitorias por estudantes) e a favor da noção de ensino superior gratuito e acessível a todas as pessoas que querem estudar.

Parte do público presente neste cinedebate

No debate foi lembrado que principalmente em sociedades muito desiguais (como é o caso do Brasil), o acesso à universidade é uma forma de promover a mobilidade social, mas o documentário ressaltou como é cada vez mais difícil para jovens oriundos das classes trabalhadores ou para jovens afrodescendentes conseguiram estudar em cursos universitários nos Estados Unidos. Ele apresentou também dados sobre como os valores que devem ser pagos por estudantes para custear seus estudos em universidades norte-americanas cresceu assustadoramente desde os anos 1980: a dívida estudantil em 2014 nos EUA já era maior que 1 trilhão de dólares! Além disso, boa parte dos investimentos obtidos com todo este dinheiro não é direcionado para bibliotecas, laboratórios ou salários de professores, mas como mostra o documentário é direcionado para equipamentos de lazer e acesso a verdadeiros shoppings ou academias esportivas dentro das instituições universitárias, o que cria a fama de universidades festeiras (“party schools”) que atraem cada vez mais jovens não em busca de conhecimento e capacitação, mas sim jovens em busca de festas e bebedeiras; há também os altíssimos salários (da ordem de mais de 1 milhão de dólares anuais) pagos a administradores que são contratados por diversas instituições universitárias para impor modelos de gestão muito pouco acadêmicos e mais preocupados com a geração de lucro financeiro no curto prazo.

Foi destacado no debate que há no Brasil setores da sociedade que advogam a cobrança de mensalidades em universidades públicas, propondo de certa forma uma privatização da educação superior. Mas, por outro lado, foi lembrado também que esta privatização em certo sentido já existe, já que 75% das vagas de ensino superior no Brasil são em instituições privadas e pagas! O professor Nelson ressaltou que uma instituição de ensino superior não deve se preocupar apenas com a reprodução do conhecimento produzido no passado (algo que ocorre sobretudo nas denominadas atividades universitárias de ensino), mas também com a produção de novos conhecimentos que possam gerar riquezas para a sociedade no futuro (algo que ocorre sobretudo nas denominadas atividades universitárias de pesquisa). Complementando este enfoque, o professor Ricardo Plaza lembrou que no Brasil, cerca de 90% da pesquisa é feita em universidades públicas (estaduais ou federais), e mesmo os outros cerca de 10 % de pesquisa são feitos majoritariamente em universidades privadas “confessionais” (como as PUCs, por exemplo) que recebem muitos recursos públicos para executarem suas atividades. Geralmente a maioria das pesquisas científicas e tecnológicas demora muitos anos ou até décadas para produzir um retorno financeiro e somente o estado pode fazer – de modo justificado – um investimento a fundo perdido neste sentido, já que os conhecimentos produzidos pelas pesquisas redundam em benefício de toda a sociedade ao longo do tempo; as instituições privadas, pela sua própria natureza, estão interessadas em lucros imediatos a curto prazo (alguns meses ou poucos anos). Diversos dados que permitem elucidar melhor esta questão são apresentados no artigo “Relatório mostra que universidade particular no Brasil não produz conhecimento” no link: <http://cartacampinas.com.br/2018/01/xrelatorio-internacional-mostra-que-universidade-particular-no-brasil-nao-produzem-conhecimento/>.

Uma frase interessante lembrada pelo professor Nelson no debate foi “O olho não vê a si mesmo”, pois permite refletir sobre como muitas vezes não conseguimos enxergar os nossos próprios preconceitos em diversos tipos de situações sociais, políticas ou econômicas. Além disso, ele ressaltou que profissionais formados em cursos da área STEM – “Science, Technology, Engineering and Mathematics” (“Ciência, Tecnologia, Engenharia e Matemática”) frequentemente acabam adquirindo salários mais altos que a média e para evitar um aprofundamento da desigualdade na sociedade é importante que estes cursos procurem incluir mais meninas no seu corpo discente. O professor Ricardo Plaza na mesma linha de raciocínio lembrou que diferentes pesquisas indicam que ambientes de ensino e pesquisa com maior diversidade (com respeito a gênero, raça, etnia, orientação sexual, classe social, etc) são mais produtivos que ambientes sem diversidade, devido ao fato de que a diversidade acaba sendo um terreno fértil e uma fonte muito mais ampla de diferentes ideias para resolver problemas e superar obstáculos.

Imagem apresentada no documentário que mostra o valor total da dívida estudantil nos EUA em 2014

Um bom artigo de análise a respeito deste documentário, intitulado “Torre de Marfim – Um panorama sobre a mercantilização do ensino superior nos Estados Unidos” e escrito por Katya Zuquim Braghini pode ser lido em: <http://www.revistas.usp.br/comueduc/article/viewFile/89950/96721>. Um trecho deste artigo é destacado a seguir por revelar dados importantes para esclarecer melhor as questões envolvidas: “O filme tece um panorama histórico das diversas modalidades de ensino superior existentes e demonstra, com gravidade, o processo de estratificação social que distancia cada vez mais os jovens pobres das universidades socialmente prestigiosas. Em 2011, cerca de 75% por cento dos estudantes nas duzentas escolas mais bem classificadas do país vieram de famílias do quartil superior de renda. Apenas 5% são de famílias do quartil inferior. A pergunta de fundo do filme é: Qual é o papel da universidade diante da desigualdade de renda sem precedentes na história dos Estados Unidos?”

Mais informações sobre esta obra cinematográfica e as reflexões que ele produz podem ser obtidas no sítio que é indicado no próprio documentário: <http://www.takepart.com/ivorytower/>.

No dia anterior a este cinedebate foi eleita a nova chapa que conduzirá o Diretório Acadêmico dos estudantes do IFSP-Caraguatatuba. A estudante Rafaela Ribeiro Pim do Nascimento (da Licenciatura em Matemática) foi eleita presidente do Diretório Acadêmico e o estudante Kauã Estevam Cardoso de Freitas (da Licenciatura em Física) foi eleito vice-presidente do Diretório Acadêmico. Ambos, Rafaela e Kauã estiveram presentes e participaram deste cinedebate.

Kauã Freitas, professor Ricardo Plaza e Rafaela Nascimento

As sessões de cinedebates são regularmente organizadas por bolsistas e ex-bolsistas de iniciação científica e de extensão no âmbito do programa de extensão “Cinedebate e atividades de educação científica e cultural” que é coordenado pelo professor Ricardo Plaza e conta na sua equipe também com os professores Mauro Chaves e Alexandre Rosa. Seu objetivo principal é realizar reflexões críticas sobre história, ciência e cultura, envolvendo filmes e documentários selecionados com este propósito, bem como ampliar o repertório cultural e cinematográfico por parte dos alunos e do público em geral. Todas as sessões de cinedebates são gratuitas e abertas para quaisquer interessados, tanto da comunidade interna, quanto da comunidade externa ao IFSP; não é necessário fazer inscrição prévia: basta estar presente no auditório no início da exibição do filme. Professores e gestores de escolas públicas que pretendem que alunos de suas escolas participem de atividades deste gênero podem procurar o professor Ricardo Plaza para juntos organizarem os detalhes.

Fonte: Prof. Dr. Ricardo Roberto Plaza Teixeira

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